2010/06/29

Os pré-campeões do mundo


[henricartoon]

Actualização:

«Minutos depois de o Portugal x Espanha acabar, as imagens virtuais mostraram que o golo de Villa foi conseguido num fora de jogo de 22 centímetros. “A acreditar na espanhola que comparou a pila do Ronaldo a uma pizza, fomos comidos à força toda por uma pila do Ronaldo, ou seja uma pizza, ou seja 22 centímetros”, analisou o comentador de futebol e crítico da selecção Deco. “Se o fora de jogo fosse por uma pila do Queiroz, tinha sido à queima. Ficava a dúvida. Isto não é uma crítica ao seleccionador nem à sua virilidade. Gosto muito do Queiroz. Em especial quando trabalhava no Japão”, concluiu Deco»
[Mário Botequilha in o Inimigo Público]

2010/06/28

A novela das SCUT

Ao contrário dos impostos, que nenhuma contrapartida directa providenciam, o carácter bilateral das taxas deveria aplacar a natural resistência à investida sobre a esfera patrimonial do pagador. Tal nem sempre sucede, mas essa particularidade não vem hoje à pena.
As portagens nas denominadas auto-estradas sem custos para os utilizadores (SCUT) têm sido mote de um dos mais atamancados enredos políticos dos ultimos tempos.Tudo começou quando o governo anunciou o fim da circulação sem pagamento de portagem, em parte das auto-estradas anteriormente sem custos existentes no país. Posteriormente foi definida uma forma de cobrança a efectuar exclusivamente mediante um dispositivo electrónico de matricula (DEM), vulgo chip, a instalar em todos os veículos automóveis passíveis de circular em auto-estradas nacionais, em complementaridade com pórticos de leitura e identificação, que foram há já largos meses plantados nos troços de estrada eleitos. O debate em plenário da Assembleia da República de quinta-feira última inviabilizou a aplicação do malfadado chip. Todavia, o inicio do pagamento de taxa de portagem estava e tanto quanto sei mantêm-se definido para a próxima quinta feira, ou seja, mesmo que o sistema de cobrança proposto tivesse merecido aprovação, teria restado uma semana aos condutores para adquirirem e instalarem o equipamento antes de poderem circular nas mais estruturantes e movimentadas vias nortenhas. Sem o DEM, sobra a cobrança de método clássico, com praças de portagem. Considerando que as SCUT estão dotadas de maior número de acessos por quilometro que as auto-estradas construídas de raiz, tal representa não só custos de construção não orçamentados, bem como de manutenção e de recursos humanos por parte das empresas concessionárias. Se a opção for fechar parte dos acessos locais existentes desde a construção, é fácil imaginar o coro de protestos dos utentes, a acrescer ao descontentamento que esta nova disposição já tem gerado. Sabemos que o país precisa de fontes de receita agora. Se tal implicar custos significativos e se o beneficio financeiro for diferido, previsivelmente ao cabo de anos, esta caricata narrativa vai provavelmente mudar de rumo. Por umas e outras, confio que o primeiro cêntimo nunca chegará a ser arrecadado. De qualquer das formas, não passa de uma conjectura - a minha.

Actualização (2010/12/31):

É sabido que os ditados populares tanto erram como acertam, mas "pau que nasce torto, tarde ou nunca se endireita" aplica-se a este processo como menhum outro. E sim, a coisa lá foi avante. Mas não, não deixou de ser feita com os pés, como bem se ilustra, por exemplo aqui.

2010/06/25

Descubra as diferenças #2


Vá-se lá saber porquê, ao saber disto, recordei-me subita e inusitadamente disto. Parafraseando Blaise Pascal, «O coração tem razões que a própria razão desconhece». E Freud concordaria.

2010/06/18

José Saramago 1922-2010


«O cão das lágrimas não se misturou com os antigos companheiros de matilha e caça, a sua escolha está feita, mas não é animal para ficar à espera de que o alimentem, já vem a mastigar não se sabe quê, estas montanhas de lixo encerram tesouros inimagináveis, tudo está em buscar, revolver e achar. Que revolver e buscar na memória vão ter também, quando a ocasião se apresentar, o primeiro cego e a mulher, agora que já aprenderam os quatro cantos, não da casa onde vivem, que tem muitos mais, mas da rua onde moram, as quatro esquinas que passarão a servir-lhes de pontos cardeais, aos cegos não Ihes interessa saber onde está o oriente ou o ocidente, o norte ou o sul, o que eles querem é que as suas tenteantes mãos Ihes digam se vão no bom caminho, antigamente, quando ainda eram poucos, costumavam usar bengalas brancas, o som dos contínuos golpes no chão e nas paredes era como uma espécie de cifra que ia identificando e reconhecendo a rota, mas, nos dias de hoje, sendo cegos todos, uma bengala dessas, no meio do retintim geral, seria pouco menos do que inútil, sem falar que, imerso na sua própria brancura, o cego poderia chegar a duvidar se levaria alguma coisa na mão. Os cães têm, como se sabe, além do que chamamos instinto, outros meios de orientação, é certo que, por serem míopes, não se fiam muito da vista, porém, como levam o nariz bem à frente dos olhos, chegam sempre aonde querem, neste caso, pelo sim pelo não, o cão das lágrimas alçou a perna nos quatro ventos principais, a aragem se encarregará de o guiar até casa se algum dia se perder.»

[ensaio sobre a cegueira]

A ler